domingo, 31 de outubro de 2010

O Sonho



Nos anos 80 sonhava-se com o futuro. Sonhava-se que a ciência iria resolver os problemas humanos, a fome seria suprimida e a automação iria substituir o trabalho mais pesado, permitindo uma maior justiça social. Energia e software eram quanto precisávamos para obter os nossos recursos. O trabalho humano seria menos necessário, e os produtos resultantes da automação seriam cada vez mais baratos.


Para manter o pleno emprego, o horário de trabalho seria reduzido e a reforma viria mais cedo. Como as pessoas viveriam mais tempo, elas podiam, a partir de certa altura, encetar uma nova vida e dispor de mais tempo para o convívio e educação dos mais novos. Haveria mais produção artística e intelectual e inovadora que resultaria do gosto de criar, o que se faria por opção. Na verdade, já estávamos nesse caminho.


Desde então, existiram imensos progressos da genética, da engenharia, da energética e da informática que facilitariam o sonho. A automação aumentou, os seus produtos embarateceram, apareceram as energias renováveis e o software não pára de substituir o trabalho humano, cada vez menos necessário. Mas aumentaram as exigências e o horário de trabalho, bem como a idade da reforma, à custa de um desemprego cada vez maior.


Temos hoje melhores condições para cumprir o sonho, no entanto caminhamos no sentido inverso, em direcção ao pesadelo. Nos anos 80 sonhava-se porque não se tinha previsto que o lucro fosse o valor supremo dos anos que a seguir viriam.


Texto de J. Pio de Abreu publicado no blog De Rerum Natura

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